Postby Aignes » 01 Jun 2007 23:30
Registou uma última vez aquele novo exemplar e fechou a porta cuidadosamente. Haveria tempo para si, com calma e paciência. Sentia-se inquieto, qual cientista à espera de experimentar uma nova hipótese em cobaias por estrear. Avançou pelo corredor verde, de paredes nuas e chão silencioso, enquanto estalava a língua, excitado, adorava quando recebiam novos carregamentos. Tinha ainda de esperar pelas formalidades, era certo...observações e estudos e muitos gráficos comparativos que já lhe tinham sido explicados tantas vezes, que lhe explicavam de cada vez que as recebiam. Mas não memorizava, não atribuía qualquer importância a todos esses processos...desde que no final as tivesse para si, para o seu fim último, para si. Desistiu então do barulho irritante que fazia e abriu a segunda porta daquele corredor verde.
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A língua de Susana estava finalmente menos dormente, o corpo mais móvel, a cabeça mais clara, ainda que uma dor se começasse a alastrar pelas têmporas acima, como hera numa árvore carcomida. Todo o corpo sentia-o coberto por um torpor viscoso que a prendia, fragmentos dispersos de memórias a ricochetearem na sua mente dorida...confusão, amarras fortes nos seus membros, vozes sussurradas e imagens desfocadas. De repente, apercebeu-se que não tinha os óculos postos. Sentiu-se mais tranquila, a visão desfocada não era pela luz intensa do quarto nem por quaisquer substâncias desconhecidas que lhe tivessem administradas. Estava a observar, a custo, a escassa mobília do local onde se encontrava quando a porta branca se abriu.
«The force that through the green fuse drives the flower
Drives my green age; that blasts the roots of trees
Is my destroyer.
And I am dumb to tell the crooked rose
My youth is bent by the same wintry fever.»