Segurava-me pela mão enquanto caminhava sobre a grossa parede do castelo.
- Não há perigo Zé, não caio.
- Podes sentir uma tontura ou assim.
Os olhos do Zé mostravam um medo que não confessava a ninguém. Não confiava em mim.
Sentia a brisa leve que me trazia o cheiro do mar. As gaivotas voavam em círculos sobre nós; lá em baixo, crianças jogavam à bola e soltavam pequenos gritos de felicidade. O sol estava tímido naquele dia e não nos deixava gozar o fim das férias. Zé tinha-me trazido para a casa de praia dos pais para me esconder deles. Eu sabia, ele sabia e eles também. O Zé podia esconder-me onde quisesse, nada os impediria de me encontrar. Quando chegasse a hora...
Olhava para as biqueiras brancas das sabrinas que avançavam sobre as pedras da muralhas. A mão fria firmemente segura entre as grandes mãos do Zé. E os olhos dele presos em mim.
- Que foi Zé? Que temes?
- Nada amor, nada.
Nervosamente baixara os olhos para o chão.
- Conta-me. Tu podes falar sobre tudo comigo.
Parara sobre a muralha e virava-me para ele, sentindo o vento a crescer e a fazer esvoaçar-me o cabelo.
- Estava aqui a ver como parece uma imagem de um filme. O teu cabelo tão lindo a voar, os teus olhos parecem mais verdes. Estes dias aqui fizeram-te bem, não foi?
Sorri e recomecei a minha marcha. Ele não percebia nada, não percebia a importância que este bebé dentro de mim teria. Não percebia que isto era tudo mais importante que eu, que ele, que nos.
O vento aumentava e as poucas pessoas que passeavam na praia tinham desaparecido. O tempo tinha mudado repentinamente, as gaivotas piavam de forma pavorosa e as ondas do mar aumentavam em cada bater nas rochas. Olhei para o céu carregado de nuvens e um crescente roxo foi-se apoderando das nuvens.
- Desce daí, Ana. Está a ficar muito vento.
Ele não via o que eu via, ele não sabia, não percebia. Tonto. Tolo. Eu e o bebé estávamos prontos, ele não. Sentia o bebé dentro de mim, dentro deste enorme ovo onde ele crescia.
- Tens razão Zé, está muito vento. Mas faz-me bem estar aqui, deixa-me abrir os braços e saborear o vento.
- Ana desce por favor.
- Eu estou bem, este lugar faz-me bem. Sente o bebé a mexer-se.
Tontamente, o Zé largou-me a mão e colocou as dele sobre a minha barriga.
Feliz, sorriu e não viu o que iria acontecer.
Levantei os braços e voei.